A oportunidade do Brasil de liderar o diálogo global sobre clima e energia

O Brasil tem a matriz energética mais limpa do G20

O Brasil é um líder em transições para energia limpa: entre as maiores economias do mundo, tem a menor participação de combustíveis fósseis em sua matriz energética. Ocupando a Presidência do G20 em 2024, o Brasil tem a oportunidade de liderar a agenda global de transição energética, com base em seu sistema de energia baseado em energias renováveis e no seu grande setor de biocombustíveis. O país também vai ser sede da conferência sobre mudanças climáticas COP30 no ano que vem em Belém, cidade que é uma porta de entrada para a região amazônica, o que colocará as suas iniciativas em prol da energia limpa sob os holofotes internacionais.

Total energy supply for G20 countries by energy source, 2022

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O Brasil superou uma miríade de desafios para se tornar um líder em energia limpa. Ao longo de décadas, enfrentou atrasos em grandes projetos, apagões e uma série de obstáculos econômicos relacionados à fatores nacionais e internacionais. Exploramos estes desafios abaixo, pois eles trazem insights valiosos para transições energéticas globais, e possíveis caminhos para acelerar o progresso.

Diversificando fontes de energia e primando pela resiliência

Amplos recursos hídricos e projetos de referência como a Usina de Itaipu forneceram ao Brasil uma base sólida em geração hidrelétrica, mas também deixaram seu setor elétrico vulnerável a um clima em mudança. Em 2001, a baixa precipitação, juntamente com investimento limitado em geração e transmissão, levou a uma série de apagões, resultando em racionamento e outras medidas políticas para reduzir a demanda por eletricidade.

Nos anos seguintes, o Brasil trabalhou para melhorar e diversificar suas fontes de eletricidade, direcionando investimentos para energia eólica, solar e de biomassa. Houve também um foco na expansão e modernização da rede elétrica para aumentar sua confiabilidade, reduzir perdas e aprimorar o equilíbrio entre oferta e demanda de modo a facilitar a integração de fontes de energia variáveis.

Intervenções regulatórias apoiaram a participação de produtores independentes de energia e um conjunto de medidas políticas – incluindo incentivos fiscais, acordos bilaterais e leilões de energia renovável – galvanizaram investimentos em energia limpa. De 2000 a 2022, a participação da eletricidade de hidrelétricas na matriz energética caiu em um terço para pouco menos de 65%, mas a participação de renováveis em geral permaneceu estável em torno de 90%.

Electricity generation in Brazil, 1990-2022

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Impulsionando a inovação através do aproveitamento de recursos limpos nacionais

O Brasil é pioneiro na produção de biocombustíveis, combinando com sucesso mandatos de biocombustíveis, incentivos financeiros e requisitos de sustentabilidade para expandir a oferta de biocombustíveis de forma segura e acessível. O país também foi o principal propulsor da demanda global por biocombustíveis até o início dos anos 2000, quando os Estados Unidos, a Índia e outros países seguiram seu exemplo.

Hoje, o setor de transporte é a principal fonte de demanda por combustíveis fósseis no Brasil, que depende fortemente do transporte rodoviário. Mais de 90% da demanda de energia no setor de transporte do país vem do transporte rodoviário, comparado a uma média global de cerca de 75%. Os mandatos de mistura de etanol começaram após a crise petrolífera de 1973 com o programa Pró Álcool, que visava reduzir as importações de petróleo alavancando a força agrícola do Brasil. Os mandatos de mistura aumentaram gradualmente ao longo dos anos, atingindo um teor volumétrico de mistura de 27% para o etanol e 12% para o biodiesel. E eles devem crescer ainda mais, chegando a um teor de 15% para o biodiesel em 2026.

Décadas de investimento em pesquisa e inovação tornaram isso possível. Veículos flex-fuel, que podem rodar à gasolina ou etanol, foram desenvolvidos na década de 1990 e agora representam quase 90% da frota de veículos leves do Brasil. O país também é líder global em biocombustíveis avançados (produzidos a partir de resíduos e cultivos energéticos não alimentares), usando resíduos agrícolas para expandir a oferta sem aumentar o uso do solo.

Demand of biogasoline and biodiesel, 1980-2022

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Demand of biogasoline and biodiesel in a 1.5°C Scenario, 2030

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Lançada em 2024, a política Nova Indústria Brasil traz um foco em sustentabilidade e inovação. Uma de suas metas é ampliar em 50% a participação de biocombustíveis na matriz energética de transportes até 2033. Isso vem após o lançamento da Aliança Global para Biocombustíveis do G20 em 2023 com o objetivo de impulsionar a oferta e a demanda por biocombustíveis. O Brasil também está desenvolvendo o Programa Combustível do Futuro para impulsionar a mistura de etanol, biodiesel e combustível de aviação sustentável, bem como para estruturar modelos de desenvolvimento para outros combustíveis de baixa emissão. 

Fomentando a cooperação internacional

O Brasil pode aproveitar sua força diplomática para facilitar parcerias e a cooperação global para energia limpa. O país tem uma longa história de fomento à colaboração internacional, notadamente a Rio 92, que propôs um novo modelo para ação internacional em questões ambientais e de desenvolvimento, incluindo a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. Hoje, com um setor de energia de baixa emissão e uma grande base de recursos, o Brasil tem as condições certas para desenvolver clusters industriais junto com outros países, o que será fundamental para transições para emissões líquidas zero. O país já está tomando medidas nessa direção, trabalhando com os Estados Unidos para descarbonizar o setor siderúrgico, com a União Europeia para iniciar a produção de hidrogênio de baixas emissões e com a China para fabricar veículos elétricos e baterias.

O desenvolvimento de combustíveis sustentáveis ​​é uma das várias áreas nas quais o diálogo global sobre clima e energia poderia se beneficiar da liderança do Brasil. No Cenário de Emissões Líquidas Zero até 2050 da Agência Internacional de Energia, a demanda por combustíveis sustentáveis ​​— como biocombustíveis, biogases e hidrogênio de baixas emissões — dobra até 2030 e quase dobra novamente até 2050. Os combustíveis sustentáveis ​​constituem opções importantes para a transição do uso de combustíveis fósseis no setor industrial e de transporte, servindo como uma medida complementar à eletrificação e à eficiência energética. ​

Aumentar o investimento em energia limpa em economias emergentes e em desenvolvimento é essencial para garantir transições seguras, justas e acessíveis para emissões líquidas zero. Para atender às crescentes necessidades de energia de forma alinhada ao Acordo de Paris, o investimento anual em energia limpa precisará mais do que triplicar nessas economias até o início da década de 2030. No entanto, uma capacidade fiscal limitada significa que há pouco espaço para incentivos além do estabelecimento de metas. Instrumentos de financiamento sustentável​​ podem ajudar a reduzir o alto custo de capital e propiciar o tão necessário investimento. Em colaboração com o Banco Mundial e com o Banco Interamericano de Desenvolvimento, o Brasil lançou um Título Soberano Sustentável que permitiu um financiamento mais adaptado às suas necessidades e objetivos particulares.

Ainda outra tarefa fundamental é garantir que a transição para energia limpa se centre nas pessoas e atenda às necessidades dos mais vulneráveis. O Brasil implementou programas com esse objetivo, como o PRONATEC, que apoiou as cadeias de valor de produtos florestais e combateu o analfabetismo, ou o Plano ABC+, que inclui suporte a pequenos agricultores e a produção de bioenergia a partir de resíduos agrícolas. Na conferência do clima COP28 em Dubai em 2023, ele revelou um Plano de Transformação Ecológica com o objetivo de promover o desenvolvimento econômico com base na sustentabilidade ambiental, no emprego e na produtividade, e na justiça social.

Soluções para as necessidades energéticas e climáticas dependerão de ações nacionais e internacionais. O Brasil está bem ciente do imperativo de progredir mais rápido. Ele sofreu em 2024 com enchentes devastadoras no estado do Rio Grande do Sul e incêndios na região do Pantanal. O país está trabalhando em muitas frentes para melhorar as perspectivas climáticas, com implicações importantes para sua agenda internacional. Em um momento em que países ao redor do mundo buscam atingir as metas internacionais de energia e clima, o Brasil tem experiências, expertise e ideias valiosas para expandir a economia de energia limpa global.